Resignação

Estou numa cadeira, sentado no canto da sala.
Estou parado há anos e vejo a vida que, pela janela, passa.
Relembro, dia após dia, os tempos passados de outrora
E me contento com esta cadeira e uma televisão que vez ou outra tem imagem... oras!

O mar a que tanto amei hoje é de sentimentos obscuros.
Às vezes flerto com a morte, outras é ela quem me procura.
E de tanto sentar nesta cadeira, ou naquele sofá
Os músculos já se contentaram em parar.

Por certo, há saudades nas pernas e nos braços, mas o cansaço venceu.
Há saudades no cérebro, por fora, no corpo inteiro.
Mas que corpo é esse que não responde aos gritos da alma?!

E o coração?
Esse desistiu de perguntar onde está.
Ele sabe. Eu sei...
Estou nesta cadeira.
Estou com o coração no mar, mas o corpo já não pode mais navegar.

(Victor Lucena)

AH, UM SONETO...

Poema-Inspiração

Meu coração é um almirante louco
Que abandonou a profissão do mar
E que a vai relembrando pouco a pouco
Em casa a passear a passear...
No movimento (eu mesmo me desloco
Nesta cadeira, só de o imaginar)
O mar abandonado fica em foco
Nos músculos cansados de parar.
Há saudades nas pernas e nos braços.
Há saudades no cérebro por fora.
Há grandes raivas feitas de cansaços.
Mas — esta é boa! — era do coração
Que eu falava... e onde diabo estou eu agora
Com almirante em vez de sensação?...

(Álvaro de Campos)

Encante-se com nossos poetas